segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Colisão de fatos


Pois bem. O ‘eu te amo’ havia se tornado uma faca de dois gumes, talvez a última frase da minha lápide de vida. Eu o disse inúmeras, imensas, incansáveis vezes, e era como se a resposta fosse um eco, que no fim das contas, era promovido pelo impacto nas paredes de casa. A casa havia caído.

O dia então nasceu com lua. Eu havia passado a noite chorando sobre os cabelos e o travesseiro. As estrelas olhavam e riam, enquanto lançavam suas luzes para dentro dos meus olhos vermelhos e entreabertos. Tive muito medo de abri-los. Pela primeira vez não senti prazer em ser, em me ser, em ver meu reflexo inundado de lágrimas malditas e imundas, lágrimas tolas que rolavam sem sentido algum, pelo menos algum sentido que fosse válido. Passei os dias deitada no chão relembrando uma voz doce que eu nunca ouvi, e vivendo os dias que eu jamais hei de viver.

O ‘eu te amo’ havia mentido para mim. Era banal, estúpido. Eu fui crédula até onde pude, até notar que amar alguém se deve começar de si. O si que eu abandonei, abstrai. Vive pelo ‘eu te amo’, aquele mesmo que eu descobri ter sido somente um eco todo esse tempo.

Então eu levantei-me de uma vez só. Disse à mim mesma: tenho fé. Acabei aprendendo que fé não existe. Mas se eu contasse isso pra alguém ou para mim, ela não valeria de nada. A princípio eu descobri que a fé é o ato de querer ter fé. É olhar o impossível, saber ser impossível e acreditar que o impossível pode acontecer. A grande verdade é que a gente acredita que acredita nisso tudo. É daí que vem a fé. Por isso você deve exercitá-la. Ter fé não é acreditar no impossível. É ter a certeza de que tudo é possível.

Então eu me reergui, acreditei ter fé. Isso me enchia de ânimo, como se o sol tivesse nascido dentro de mim, e não lá fora. Ele então secou todo mar de lágrimas do chão e da alma, e eu as engoli saboreando uma caixa de morangos frescos. Eu não havia sido infeliz todo esse tempo, algo de bom havia acontecido depois que eu caí:

Eu aprendi a levantar.

Enquanto eu estive de pé, tive medo da queda, apenas pela dor. Mas no chão eu descobri que dói muito mais se levantar e às vezes os joelhos não agüentam.

Ainda morro de medo de escapar um ‘eu te amo’ onde não exista liberdade. Tenho medo dos sons que saem da alma colidirem com as paredes da cela ou da casa do egoísmo e do engano, e voltar a mim o eco vazio e imperfeito do ‘eu te amo’.

Cansei de ecos.

Mas talvez sinta falta de ouvi-los

Vez em quando.

A Canção que tocou em mim


Tão contrário a nós é apenas essa nossa insignificância,

Prepotência de acreditar no outro quando não cremos em nós.

Desacato ao pudor de quem não é pudico,

Gritos histéricos de quem não possui voz.


Grande amor! Uma lástima perdê-lo.

Perder pras sombras, pro interior...

Eis pobre daquele que pôde um dia tê-lo

Eu ainda sinto o amargar do teu sabor.


Agora apague as estrelas, acenda as velas

E me revela todos os seus dilemas,

Hoje em mim ficou de você as saudades

E uma canção que conta os seus problemas.


E ela começa assim:


Não terá fim, morena,

Enquanto pousar sobre mim os teus lábios

Que seja posta a mesa e a cama,

Pois eu estou aqui pra te amar e te ouvir. ’


Desculpe, era tarde demais quando olhei o relógio

Você havia escrito o resto da canção,

E agora eu havia me tornado uma das estrelas que você pintava ao longe,

Dentro do seu coração.


E o resto me dizia:


‘ Acabara a noite, amor.

E não acabara o amor.

Era manhã e a estrela ainda dormia ao meu lado,

Ao acordar olhou para mim e disse que sim,

Eu seria o seu eterno namorado.

Agora nem venha me dizer que não,

Se eu ainda te amo? Sim, a resposta é a mesma.

Agora eu só preciso que você espere o tempo errado,

E no tempo certo você me beija.

Agora me deixa ir,

Me deixa...

É longe de ti que deve ficar meu corpo por um instante,

Dentro de ti devem ficar minhas lembranças

Junto a ti, a minha alma.

E o teu apelo, reconheço, me comoveu.

Certo ou errado, sempre fui eu.

Volto em setembro, desculpe o transtorno

Mas não peça socorro, meu amor não morreu. ’

Atualmente


Passo o tempo falando de nada

Pela calçada, em largos passos

Como se o girar das horas

Fosse o cantar dos pássaros.


Vago e calo

Toda dor que existe enterrada

Bem no fundo de uma areia molhada

Pelas lágrimas que dos meus sonhos caíram.


Embora eu seja só alegria,

Como o doce da luz do sol de cada dia

Eu também sei reconhecer

Que o breu da noite faz parte de mim.


E mesmo sabendo o quão livre eu estou

Sinto saudade da almeja

E da alma pequena que me acorrentou.


Apenas costume de não saber viver

De acreditar que as lágrimas regarão meus sonhos

Quando os sonhos já não fazem sentido.


Já não me resta descobrir quantas interrogações há em mim,

Cabe-me aceitar os pontos finais.

Porque a vida vai continuar zombando

E as horas passando como sinais.


E o tempo não espera,

É como flor de primavera

Que quer brotar.


segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Agora


Sinto-me cega de sentidos. Cega de sonhos e de amanhã. O meu olhar que sempre alcançou tão longa distância, hoje me faz tropeçar no agora, como se eu apenas vivesse de olhos vendados.

A razão com que a vida muda é pavorosa, sinto que as mudanças são hóspedes que vêm de surpresa, e alguns, simplesmente, resolvem ficar.

Agora, mais que tudo, é de coragem que eu preciso. Ir além, mesmo voltando a olhar pra trás. Os olhos revelam o desejo escondido, às vezes, friamente mergulhados em mágoas e orgulho.

Dói enterrar um amor vivo. Dói viver enquanto se deseja fugir de si. Dói ser si, dói não ser mais o si antigo, o si que amou, que ama, talvez.

Mas para toda dor, remédio. E para cada remédio, uma contra-indicação.

Agora as madrugadas são longas. Os devaneios, constantes... Os pensamentos vêm e vão como ondas geladas e efêmeras, capazes de desconstruir o que já estava estável.

Por perder-me de mim, agora já não encontro razão alguma. A vida vira uma longa fila de espera de banco, onde qualquer louco assalto pode ser a única emoção. Eu joguei a bula fora. Estou jogando tudo fora, tudo que me lembra quem fui.

Hoje venho até aqui como um quebra-cabeças incompleto, como um rio que já não corre mais, um pássaro que não voa, uma árvore velha...

Venho como o anjo que agora vive na Terra. Havia um buraco no céu perfeito, e foi lá que eu cai.

Mas por incrível que pareça, eu ainda não perdi a mania de me perder nas nuvens.

sábado, 22 de agosto de 2009

Passarinho


Hoje toda distância e saudade
Invade e aumenta
Por te lembrar sinto que aperta
O desejo e a meta de te lembrar.

Hoje todo amor de verdade
Se entrega a vontade de renascer.
E por saber que ele não é de passagem
Alimenta a vontade de não deixá-lo morrer.

Hoje por saber que já não existe
Nasce uma lua triste que me lembra você.
Ao redor a lua insiste em tornar-nos
Um pequeno pedaço de luz a viver.

Somos como o chão e sabão misturados
E o sabor do pecado de corpos distintos.
Somos o gelo e o copo quebrado,
Derramando as lágrimas do que era lindo.

Seremos talvez duas pequenas saudades
Das raras tardes e do amor das noites.
Seremos o gosto dos beijos amigos
Dados e devolvidos.

E o tempo passou.
Ainda ouço o passarinho.
E o amor não passará.

Ele me acordará eternamente sorrindo,
Um delicioso bom dia a vir me despertar para o próximo sonho real.
Se a realidade acaba, eu me pego sorrindo
Porque o sonho de te amar não terá final.

Separação sem soneto

Despreza minha mania medonha de morder o lábio inferior quando estou em meio ao ócio. Do teu sabor eu só preciso de água pra empurrar.
Do fim, eu só temo o rumo. Porque o fim nunca chega, e o rumo? Ele não existe.
Não pra quem ama. E o fim, existe pra quem ama?

Não.

O amor existe para o fim, para transpor as barreiras do tempo e do infinito, e das margens da distância, até mesmo à sete pés do chão. Do amor apenas o amor sobrevive em meio o tempo.
E dos planos, o que fazer? Não fazer.
Os cavalos marinhos da música já não fazem sentido algum, e não há mar gelado em que eu possa mergulhar e te pedir a mão. Não há mais mão. Só mar.
Delírios e palavras soltas, e os pés cortados não atingem o chão. A gente sente falta de uma parte nossa, que a nós nunca pertenceu. É a maldita hora do adeus daqueles que não partem.
É o não dar certo e o desajuste dos ponteiros. Mas não é o fim.
Porque o fim não existe. Nem o começo.
Você apenas nomeia instantes diferentes pra se situar no tempo, enquanto o tempo te arrasta e te leva pra outros ares, deixando suas palavras lançadas ao vento e aos ouvidos dos que ficam pelo caminho.
Talvez o vento nos faça girar, nos encontre num mesmo lugar de novo. Mas até lá,
Há de se viver.

Registro


Eu vou lembrar você
Como uma flecha, um raio de luz qualquer
Vou lembrar você
Como um sonho no peito de uma mulher
Sei que devo apagar
Os registros do que não aconteceu
Entendo que tenho que deixar
O que antes foi meu.
Mas dói, dói tanto te ver tão longe assim
Tão perto de mim
Mas que eu não possa alcançar.
Dói saber que não veremos nossos filhos nascer
A gente não fez crianças pra sonhar.
E eu ainda sou uma criança que sonha,
Mas que acabou de acordar.
Eu apenas queria viver esse doce futuro que não vem mais
Queria morar no passado
Morrer no pecado
De te amar demais.
Mas teu golpe foi tão rápido
Subitamente acordei em mim.
E vi que todos os sonhos
Por mais lindos que sejam
Também tem um fim.
Meu sonho acordou de repente
Morreu dentro da gente
E enfim...

Ainda respira.

Um número menor



Ah, o tempo anda virando
Deixando cacos e sinais pelo caminho
Eu, que ando tão louco e quase morto
Vivo os dias tão sozinho...

Caminhando pelas ruas,
Pelos nossos lugares
Hoje ouço outra voz
Deslizando em meus ouvidos

Saudade aperta nesse peito que cansou de te amar
Saudade vem na hora certa pra acabar de me matar

Ela vem tão má por dentro
Arrastando o pensamento pra onde quer que você vá.
Vai me levando tão sozinho
Pelo caminho voltando pra casa, a chorar.

Mas as pedras no chão não me farão voltar
Você as jogou fora e me deixou sem rumo algum
Era tão linda a estrada que eu cria pra gente andar
Mas de vestígios não restou nenhum.

O coração hoje hospeda um outro amor tão diferente
E aqui dentro ainda chora
A falta que me faz a gente.

Eu sei


Você já cansou de ouvir
Palavras e palavras que te fizeram rir.

Você cansou de saber
Que tudo que eu quero é poder te ter.

Aqui, onde tudo começou
Aqui, onde o sonho acabou
Eu sei que tudo tem um porquê
Mas pra que? Pra que?

Sei que você precisa sonhar
Teu sonho sozinho
Eu sei que tudo que eu tenho é que guardar
O mundo dentro do teu carinho.

Agora eu sigo sozinho
Solto como o vento que passou por ai
Eu sei que mais cedo ou mais tarde, mesmo que falte coragem
Você vai me sentir

Tão longe...
Distante...
De onde...
Eu nunca sai.

Doces verdades


Não. Talvez não.
Apenas mais uma pergunta sem resposta pra minha coleção. Cada nova pergunta, a ausência de mais uma resposta. O que eu faço? Xiiii... É, melhor eu me calar.
Hoje o céu não está azul e minhas palavras, ah... São apenas as minhas palavras. Folhas ao vento. Notas que fogem rapidamente de um violão.
Acho que é preciso ainda notar a vida. Já notou a sua hoje?
A minha é laranja claro com tons marfim, apagadinha... Talvez eu seja mais um cabelo na sopa. Gauche na vida.
Não entendo nenhum vocabulário culto e chulo que saem das bocas dessas pessoas ingratas. A lua estava lá o tempo inteiro, e era a TV que elas olhavam.
Belo grande amor. Onde está ele agora? Melhor eu ficar quieta. Não tem ninguém ao meu lado, nem na minha frente.
Já sabia que eu estava só, mas não tanto assim. E viver tanto, pra que? É, melhor eu me calar.
Hoje eu já brinquei com meus pecados, fingi amar, amei, fingi esquecer, esqueci, fingi sorrir, sorri. Hoje eu já colori o meu céu, que agora está azul. Ah! Quanta pretensão, já é noite! Sim. Agora ele está mais negro que as sombras.
Lá fora faz um friozinho aconchegante. Aqui dentro, não consigo sentir nada além do calor da minha inquietude. Sinto-me incompleta, birrenta, triste talvez. Carrego na minha barriga o futuro que eu deixei semear em mim, mas ele ainda não tem cérebro formado.
Até lá quem vai me destruir aos poucos como só eu faço? É, melhor eu me calar.
Devo ser mesmo menos normal que o resto. Mas eu espero não ser julgada pelos meus crimes, aqueles em que eu me abstraio e só espero que a noite me consuma. Você se consome? Acho melhor eu permanecer calada. Não quero que minha caixa de perguntas e ausências cresça. Já não há espaço ao menos pra mim.
E quem se importa com um espaço pra mim? Lá se vai mais um pedaço. O que importa é o espaço para as flores, as estrelas, o verde, os lábios, as árvores, aos anjos. Pelo que sei, não sou nada disso.
Pelo que sei, ainda não sei. Sou apenas o que não sei e finjo saber. Ou o que finjo saber e minto para mim e para todos. E qual é a graça de uma mentira sem um bom mentiroso? Calo-me.

Um pequeno engano


Seriam estrelas ou olhos de vidro?
Conhecer se tornou tão longe de mim.
Aos poucos percebo não saber o que se passa
Às vezes tenho tanto medo do fim.

Seria você mesmo?
Aquele anjo que me acordou pra vida,
E que hoje me faz dormir mais cedo numa sexta à noite,
Com a boca bem perto do coração, mas sem língua.

Será o pôr-do-sol o mesmo, ainda?
Ou nem ele era real?
Chegamos tarde da realidade.
E não havia aplausos no final.

De mim saíram tantas palavras, tantas letras
E os teus fonemas, ouvi uma ou duas vezes apenas.
Agora é do meu silêncio que eu tenho medo.
E não de ouvir os teus problemas.

Acho que tudo nunca foi nada.
E talvez nunca seja.
Mas eu tentei.

Ah, o amor...
Pra que?
Eu não sei quem é você.

Beija-flor




Cala agora toda sua ausência que incomoda,
Prende cada instante que quis me soltar.
Anda amor, ainda falta uma parte do caminho
E sei que sozinho não sei mais andar.

Sinto lhe informar, mas o informe da manhã
Veio me contar sobre os dias que viveremos
Creio ainda é cedo pra nos levantar
Enquanto houver nós dois o amor jamais será pequeno.

E cada gesto, cada sopro, cada mão
Prendem-me ao seu lado como antes nunca vi
Se sentir alguma falta do passado, me conte
Entenda que estou aqui e vou te ouvir.

A beleza de cada momento vai agora
Em boa hora vai embora com o tempo
E se pensa que por isso acabou, é um engano
Meu alicerce não se destrói com qualquer vento.

Ainda me lembro quando eu era seu beija-flor
Se lembra?
Eu jamais me esqueci.

E se um dia achar que esse amor ainda o alimenta,
Lembre-se das flores
E do beija-flor que mora aqui.

Vidro fumê

Será que todos nós somos bem aquilo que acreditamos ser? O que dizem de você é realmente o que você é? Quem vai saber...
Você é aquilo que se vê no espelho? Ou o que reflete de fato não somos nós? Talvez ninguém seja como pensa. Não estou relatando características do tipo, gordo, magro, baixo, alto. Não é bem disso.
Até porque os estereótipos já se encarregam disto.
Eu digo daquela sua verdade lá da alma. Mas você tem alma? Já a viu? É, suponho que não.
Isso são como as verdades. Como as nossas verdades.
Sempre haverão metidos que são humildes, e humildes que no fundo escondem um pensamento mesquinho e superior. Aqueles maldosos, que aparecem nas ruas com ar de bondade. Mas não seria bondade e maldade relativos a quem sofre e comete determinado ato?
Pois bem. Talvez não haja nenhum humilde que não esconda algum momento egoísta e esnobe no seu interior. Tampouco um bondoso que suporte maldade sem revidar. Revidar maldade é bondade?
Complexo, sei bem.
Nós somos complexos. Nós, figura alta, magra, baixa ou gorda que o espelho nos mostra diariamente? Ou aquele nós que nós mesmos desconhecemos?
Acredito até que já nos conhecemos, mas ainda há aqueles que passam do outro lado da rua para não precisar cumprimentar-se.
Acho que eu sou um tanto diferente dos demais. Diferente ainda assim, de mim.
Para mim já não basta o comum, o passível, tampouco as regras e os limites que impõe e desrespeitam. Quero liberdade com muito mais que quatro sílabas, a quero viva e pulsando em minhas mãos.
Estou me decifrando, aos poucos abandono as bússolas e a trilha de pedrinhas que eu faço pra cada passo que dou. Já não preciso ter medo de não saber voltar.
Preciso sentir o sabor de errar, mas eu não preciso gostar. Preciso?
Corrigir os erros é a única forma de revirar o passado sem andar pra trás.
E trás pra mim não é mais mistério, eu sim sou um mistério. Eu e todos os outros pronomes que vivem dentro de mim.
E sabe, eu tenho tempo pra descobrir toda essa liberdade.
Talvez eu queira até prendê-la em mim.
É necessário a prender.
Aprender.

Lilás



Ah, que bom você me vem assim!

Feito flecha que chega pra machucar.

Dá um jeito, chega a mim

E diz que vai ficar...


Que eu trago mil flores e penteio os meus cabelos,

Olho-me no espelho e te vejo me abraçar.

Sinto teu perfume que inebria onde passa,

Sinto que você vai ficar...


Preso aqui, preso por onde passar.

Preso em mim, aonde você estará.

Fica aqui, e diz que não vai voltar,

Fica em mim, aqui é o seu lugar.


E o céu ficou lilás.

Hoje eu sei: você não volta atrás.

Teu coração é meu,

Só meu.

Até nunca mais.


Até o fim.

Que fim?

Nada que existe te tirará de mim.


E se tiver fim,

A gente finda.

Toda história que nasce na glória,

Morre linda.

Arpoador



Era bem lá no fundo que o céu se mostrava,

Onde as ondas acarinhavam as pedras cinzentas

Entrelaçavam-se os sonhos e os sorrisos na noite

E há quem não entenda...


Eram todos pequenos pedaços de luz

Pequenas estrelas que no céu se ausentavam.

E tinham dentro delas o brilho que se mostrava

Na noite em que todos se amavam.


E aquele som,

Ah, aquele som que a água promovia...

Não se via estrelas no céu,

Mas não era dia.


Era apenas outro plano.

E os mesmo anjos,

Com o mesmo amor.


E brilhava como antes nunca havia visto,

No mar uma pequena estrela azul.

Haveria ela caído?

Confunde-nos as mãos, norte e sul.


Será sempre assim. E há de ser sempre.

As ondas sempre voltam a beijar as pedras cinzentas

E os anjos?

Ainda se amam, e há quem não os entenda.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Girassóis


Chega de fatos, fetos, fotos. O real tem me sido motivo de cobiça.

Se viver é tão intenso como dizem, tão magnífico e sublime, porque andam existindo demais? Andam jogando as cartas na mesa, acabaram-se as fantasias reais das crianças, e até aquele leve desespero com o futuro.

Ainda estou perdida no meio termo da minha alma, sou leve e peso como uma âncora às vezes, e às vezes sumo por puro desejo de me sentir ausente, mas se não me sentem ausente, eu desapareço, murcho, entristeço.

Deveras sei que sou uma tola às vezes, e quem nessa vida nunca foi? Sinto que a tolice tem que me feito bem enquanto eu me divirto em meio aos girassóis.

Ah, girassóis dos seus olhos, não posso negar.

Não posso negar também que eu sou uma pequena ave. Sim, pequena. Ave!

Não posso negar também que às vezes sou aquela corrente fria que passa por entre as ondas e que a maioria torce pra passar depressa. É uma delícia pertencer à minoria. Talvez você nunca descubra esse prazer, não enquanto estiver esticando os olhos pros lados para ver a quantas anda a banda da frente.

Sinto-me uma exilada, aquela velha e boa veterana de guerra, que foi deportada para a ilha vizinha, onde alguns falam algo semelhante ao catalão, outros nada sabem dizer. Ouço tantas coisas, sinto um ar de indignação ao ver as pessoas não se importarem com gente do mundo. Gente como a gente? Ah, desculpe. Não como eu.

Ah, não quero dizer que não sou gente como a gente, mas provavelmente, não sou gente como você. Se eu sou melhor? É, talvez. Se eu sou pior? Sim, quem sabe. Se são alguns valores hipócritas que ditam o valor real das pessoas, desculpe, mas não me sinto com valor algum. Não por não ser educada, civilizada e coerente, mas por não faltar em mim a humanidade de que tanto falam. Quero ser gente como a gente de verdade. Não quero errar, mas sei que, por vezes, sou um erro completo, com alguns acertos, sim. Não quero me sentir uma boa samaritana dando esmola a pobres, quero ser mais que a mão que vive estendida, ora para as mãos de coitados, ora no rosto dos semelhantes. Se isso é ser gente como a gente, desculpe, prefiro a tolice de achar que sou diferente, do que constatar a terrível verdade de ser limitada como os outros.

O jogo é meu, as regras são todas minhas. E eu ultrapasso os meus próprios limites e por vezes, trapaceio a mim mesma. Sei que meu coração tem voz forte, alta e grave, e que ele gosta de gritar pelos cantos tudo que guarda.

Inclusive as ausências. Aquela breve saudade, que passa pra te lembrar que está viva, vem e te dá aquela leve e dolorosa mordida na alma, e te trás aquelas lindas lembranças de você mesma. Aquela mesma que tanto mudou e continua igual.

Os cabelos e as roupas mudaram, e tudo tem um cheiro novo. Até as flores dos jarros da sala.

Tudo parece tão novo nesse novo presente, até os amigos. Sinto que hoje estou segura por asas de anjos, são todos lindos e falam a minha língua.

E o mundo gira, gira, um verdadeiro girassol de primavera, e essas flores não murcham, não são arrancadas, não morrem.

Enquanto tudo gira, o que é velho às vezes volta, e você continua perdido no antigo. Mudanças nunca existem pra quem não se permite, e as lembranças nunca vão deixar- nos sós em meio ao novo. São como a lua e voltam todas as noites pra iluminar os sonhos de quem se permitir viver.

Amar além do verbo

Amar é muito mais que simplesmente amar. É saber amar, deixar amar.
Libertar o que há preso em ti, e prender o que vive solto. É resistir ao tempo e deixar de resistir demais aos momentos. É ponderar as raivas e liberar os extintos, é saber que o amor pode ser belo e lindo, mas que também tem o seu dia nublado. Amar é se permitir, é ter sonhos e com quem os dividir. É ser tolo, inocente, mas não cego. O amor não cega ninguém. Amar só torna as coisas que vemos mais bonitas. Vemos alma nos sorrisos, frutas nos lábios. Amamos o simples fato de sermos únicos e completos quando temos quem amar. Mas amar também é saber perder, deixar partir.
É importante que o amor seja mútuo, porque amor egoísta não vinga. Ele se esconde, se afugenta e acaba morrendo em meio aos medos, em meio ao temor de perder. Devemos aprender a distinguir o amar alguém ou amarmos a nós mesmos. Tem gente que ama o fato do outro o amar.
O amor cresce a medida do tempo, mas se olharmos pra trás, lá mesmo já amamos da mesma forma. Porque eu descobri que não há proporção de amor, nem unidade de medida. Ele nasce e se torna único e eterno, e por isso é lindo. Amor não morre, amor descansa. Amor não vira vaga lembrança, vira sonho acordado. Aquele que se nós o remexermos um pouco, acorda. E por isso vive.
Amar é saber guiar um pássaro sobre os ombros. É saber que ele pode voar há qualquer momento. Cabe a ele voltar ou não. Há alguns pássaros que voam por medo de seguir presos aos ombros, alguns deles sentem saudades do ombro e voltam. Outros descobrem o vôo. Mas há sempre certeza de que uma hora eles precisarão de descanso, e sempre haverá um ombro vazio para um pássaro cansado. Alguns deles se perdem em meio ao ar, não encontram mais os antigos ombros. Esses, geralmente, são pássaros que sempre voarão baixinho, na esperança de encontrá-los.
Amar é deixar que o pássaro voe, mesmo isso doendo tanto. Talvez o meu não volte mais, agora penso que aquele não iria seguir comigo por muito tempo. Sei que meus ombros não ficarão sós para sempre, mas a marca dos pezinhos do passarinho que voou, está selada como tatuagem, não só nos meus ombros, mas no meu peito.
Mas voe.
E que voe o vôo mais lindo, e eu estarei no chão sob a sombra das tuas asas.

Fim


Pegadas na areia me mostram os velhos passos

Caminhos traçados,

pés fortes no chão, pisados

E basta apenas uma onda mais forte

Para que a areia se recomponha.

Disponha então de todo amor

Porque às vezes o amor é findo

Mesmo muito mais que lindo,

Também sabe dizer adeus.

E num oceano de lágrimas

As mágoas não afundam com as ondas

Elas ficam a deriva do tempo,

Até que se tornem parte do mar.

Porque os amores são apenas águas passadas

E o oceano, uma vida inteira.

Uma vez mergulhado um coração,

Eternamente à mercê de uma nova paixão.

A maré sobe e desce,

Leva e retorna.

E a vida transforma tudo que se vai,

em lembrança.

As ondas então despertam novos olhares

Transformam antigas paisagens em novos lugares.

Fazem entender que tudo na vida

Um dia finda.

E por mais belo e doce que tudo seja

E por mais que seja o que não se deseja

Um dia, tudo

chegará

ao

...

Pássaro de espinhos


Sim.
Sinto-me livre. E desta liberdade absoluta, sinto-me presa, como as estrelas no céu.
O vento já não me arrasta, já não me provoca um sorriso largo e feliz, os sorrisos se escondem às vezes de mim, e me deixam na companhia da solidão de sempre.
O tempo é úmido, e aqui dentro as coisas permanecem secas, como as antigas flores guardadas que exalam o perfume da saudade daqueles dias. Dias que não voltam, pelo simples fato de não existirem.
O perfume então se espalha, embriaga-me de falta, transborda-me de ausências. Mas dentro do peito falta espaço pra guardar os dias que me esperam. Eles batem na minha porta enlouquecidamente, mas me faltam educação e vontade para convidá-los a entrar.
Agora descobri o quanto é preciso me reinventar. O quanto eu devo morrer para poder nascer de novo, e como eu nasço cada vez mais forte. Descobri que tentar medir amor por palavras é tão errôneo como achar que o amor mora nelas. Palavras podem ser prova, garantia. Sentimentos podem ser efêmeros e ingratos. No fim das contas sobram enganos, tinta e papel. Ah, e algumas lágrimas derramadas em cima.
Por isso ando livre. Por isso só escrevo de mim, por mim. Não são mais coletivas as minhas palavras. Ouçam e leiam quem as quiser ouvir e ler. Mas já não gritarei pelo mundo as minhas idéias. Porque elas sempre mudam e vêm me cobrar garantia de permanecerem vivas.
Hoje, tempo presente, o que me faz viver não pode ser passado, ou ao menos futuro. Quero sofrer o hoje, amar o hoje, ser e viver tudo que contém o hoje. Pecar pelo simples fato de não pensar em nada. Nasço no hoje, morro no hoje. Venho todos os dias como um botão de rosas fechado, e termino o dia seca como uma rosa antiga. Cabe a mim, crescer, abrir-me, exalar tudo que sou e sei através de perfume. Espetar alguns com meus espinhos, ser motivo de sorriso e alegria para outros.
Pelo fato de surgir a cada dia, faz com que cada dia venha de forma diferente. Venho em diferentes jardins, de diferentes lugares. Ora buquês apaixonados, ora o momento de adeus de alguém querido.
Os dias passam, as vidas me são dadas e eu, ainda sim, erro. O sabor do erro é como de um doce- surpresa. Às vezes eles são amargos, em outros momentos os erros são doces. São eles que nos fazem aprender o certo, são eles que me tornam mais forte a cada dia.
Por muitos momentos acreditei que eu estivesse perdida. E quer saber... eu realmente estava. Mas as rotas pré-estabelecidas às vezes nos deixa cômodos demais com o hoje. E meu hoje é perdido, não me foram dados mapas, rotas, coordenadas. Se irei encontrar sombra pra descansar enquanto fico procurando a normalidade do resto das pessoas, é uma questão de escolha. Às vezes ficar embaixo do sol nos faz enxergar melhor o brilho das coisas. Descansar na sombra é para os fracos, covardes e acomodados. Enfrentar o sol é para os fortes, corajosos e desenfreados. Andar devagar é para os cansados. Andar com pressa, para os ansiosos. Assistir a caminhada é para os tolos. Ser protagonista da vida, para os exagerados. Viver o mundo e deixar que o mundo viva e reviva, é para mim.